Tiago Gillot sobre precariedade

“(…) A minha parte do dinheiro servirá para pagar dívidas à Segurança Social. Parece-me que é um fim nobre.
Não sei se é costume dedicar-se este tipo de prémios a alguém, mas vou dedicá-lo.
A todos os jornalistas precários.
Passado um ano da publicação destas reportagens, após quase três anos de trabalho como jornalista, continuo a não ter qualquer contrato.
Não tenho rendimento fixo, nem direito a férias, nem protecção na doença nem quaisquer direitos caso venha a ter filhos.
Se a minha situação fosse uma excepção, não seria grave. Mas como é generalizada – no jornalismo e em quase todas as áreas profissionais – o que está em causa é a democracia.
E no caso específico do jornalismo, está em risco a liberdade de imprensa.
Obrigado.”

Fará 10 anos em setembro que João Pacheco, jornalista, proferiu estas palavras na cerimónia de entrega dos Prémios Gazeta 2006, os mais importantes galardões do jornalismo nacional. Tinham-lhe concedido o Gazeta Revelação, destinado a jovens jornalistas com menos de 30 anos.
Na plateia, as palavras foram ouvidas por entre reações de incómodo e sorrisos amarelos de condescendência. Cavaco Silva, Presidente da República, estava lá e, por isso, os recados do jovem jornalista tornaram-se notícia.
A precariedade era uma palavra estranha no léxico português. A solução de quem lutava contra relações laborais baseadas em falsos recibos verdes, sucessivos contratos a prazo ou a intermitência das empresas de trabalho temporário era fazer guerrilha política. Usar a imaginação, o exagero, a ação direta para colocar o problema no centro do debate público e político. Pacheco, na altura ativista nos Precários Inflexíveis, um grupo informal conhecido como “os PI”, usou a oportunidade.
Muito se andou. Grupos, associações formais ou informais de trabalhadores fizeram um combate que engrossou na última década e talvez tenha tido o seu momento alto meses antes da queda do Governo Sócrates e da entrada da Troika em Portugal, no Protesto da Geração à Rasca, a 12 de março de 2011.
Os Precários Inflexíveis, que hoje são uma “associação de combate à precariedade” têm sido o sindicato do precariado, liderando a organização da resistência e contestação nas ruas e as propostas políticas e legislativas no Parlamento, como a Lei Contra a Precariedade.
Falámos com Tiago Gillot, uma das caras mais conhecidas dos PI, sobre trabalho, as origens da precariedade, os seus efeitos e, ainda, sobre uma das maiores conquistas políticas que estas e estes trabalhadores tiveram nos últimos anos: o lançamento, pelo Governo, do PREVPAP – Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública.

Fotografia: Precários Inflexíveis

A 6 de outubro de 2023, alterou-se o título deste artigo substituindo a citação A precariedade é a tentativa de conseguir a vitória do isolamento” pelo tema da entrevista.

Subscreve a newsletter

Escrutinamos sistemas de opressão e desigualdades e temos muito que partilhar contigo.