Furo de gás em Aljubarrota

Agência do Ambiente diz que “não é possível concluir” necessidade de avaliação ambiental

A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emitiu a 5 de junho o parecer sobre a sujeição a Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) do furo de prospeção de gás natural que a empresa australiana Australis Oil & Gas Portugal quer realizar, em Aljubarrota, freguesia do concelho de Alcobaça, em 2019.

A decisão do organismo presidido por Nuno Lacasta é uma não decisão: “Não é possível concluir sobre a sujeição do projeto a procedimento de avaliação de impacte ambiental (AIA)”, pode ler-se. Segundo a APA, “o desconhecimento da localização exata do furo impede a plena caraterização do projeto e do local, aspetos determinantes para que possam estar reunidos todos os elementos necessários para aferir da aplicabilidade do regime jurídico de AIA.”

As informações submetidas pela Australis Oil & Gas Portugal à APA não são precisas. No “Documento de apresentação dos elementos para Apreciação Prévia de decisão de sujeição a avaliação de impacte ambiental”, datado de fevereiro de 2018, pode ler-se: “A Australis, pré-selecionou uma área que compreende uma área de aproximadamente 1km de raio, dentro da qual o poço estará localizado. Salienta-se que embora exista esta área selecionada na qual será definido o local da sondagem, não existe nesta fase uma localização definitiva e exata desse local. A localização exata, dependerá da avaliação detalhada das características e restrições ambientais, técnicas e sociais que possam existir em algumas parcelas identificadas e em análise, assim como da possibilidade de celebração de um contrato para o efeito, com o(s) proprietário(s) da parcela.”

Mapa: Australis

No mesmo documento, a Australis Oil & Gas Portugal informa que o furo teria uma “profundidade de aproximadamente 3 200 m” e que a área a ocupar pelo projeto seria de “aproximadamente 7 500 m2”. Os trabalhos da primeira fase – “preparação, construção e instalação” – tinham uma duração estimada de “60 dias”, envolvendo 22 pessoas. Ao longo de todas as fases do projeto seriam necessárias 268 pessoas para trabalhar: 88 portuguesas e 180 estrangeiras, segundo as estimativas da empresa de gás.

Assim sendo, a APA opta por não decidir, ficando por perceber o que acontecerá à intenção da empresa petrolífera furar em Aljubarrota já no início do próximo ano. Segundo a lei, é a Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis (ENMC) que dá licença para se fazer o furo, mas tem de pedir um parecer prévio à autoridade de Avaliação de Impacte Ambiental, a Agência Portuguesa do Ambiente, para que esta se pronuncie sobre os eventuais impactes do projeto a nível ambiental.

Tal como fez com o furo de Aljezur, a APA abriu uma consulta pública entre os dias 27 de março e 11 de maio, perguntando às populações o que pensavam sobre a “apreciação prévia de sujeição a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental da Sondagem de Prospeção e Pesquisa na Área de Concessão Batalha”.

O Relatório de Consulta Pública data de maio, mas só a 3 de julho, foi publicado no site Participa, o portal do Estado onde são anunciadas todas as consultas públicas a cargo do Ministério do Ambiente. Diz o documento que “a quase totalidade dos pareceres manifestam-se a favor de um procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental do projeto em análise, tendo em conta a localização, a dimensão e as características do mesmo.”

Apresentaram exposições 81 pessoas particulares e ainda a Câmara Municipal da Batalha, a Assembleia de Freguesia de Aljubarrota, a Associação de Defesa do Ambiente e do Património da Região de Leiria – OIKOS, a ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável, a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, a Plataforma Algarve Livre de Petróleo, a Glocal Faro, a ASMAA – Algarve Surf & Marine Activities Association e o Grupo Proteger Telheiro.

A APA autorizou, no passado 16 de maio, o consórcio ENI/Galp a realizar uma sondagem de prospeção de petróleo 46,5 quilómetros ao largo de Aljezur, sem Avaliação de Impacte Ambiental: “o projeto não é suscetível de provocar impactes negativos significativos“, disse aos jornalistas Nuno Lacasta, presidente do Conselho Diretivo da APA. Uma semana depois, vários coletivos pediram a sua demissão, bem como a do Ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes.

Questionado sobre o teor do parecer da APA, o Ministério do Ambiente remeteu para as declarações do ministro na sua ida ao Parlamento, no passado dia 27 de junho, quando foi ouvido na Comissão de Ambiente e Ordenamento do Território. Por requerimento do Bloco de Esquerda, o governante foi chamado para se pronunciar sobre a dispensa de estudo de impacte ambiental à prospeção de hidrocarbonetos ao largo de Aljezur e também sobre a situação do furo em Aljubarrota.

Na sua intervenção inicial, em resposta ao deputado bloquista eleito por Faro, João Vasconcelos, o governante referiu-se às decisões da APA. As suas palavras foram estas: “(…) a decisão é administrativa. Tal como foi administrativa, em relação aos furos de pesquisa de gás, em Aljubarrota – [nas concessões] “Pombal” e “Batalha” – a decisão de rejeitar, por insuficiência documental, o “screening” dos furos de gás. Os elementos presentes não sustentavam uma decisão, pelo que o processo foi devolvido, devendo ser reiniciado, com a sugestão, até, de que se avance para um Estudo de Impacte Ambiental. A decisão está tomada, senhor deputado. (…)”.

Portando, segundo as palavras do ministro, o processo de “Apreciação prévia de sujeição a procedimento de Avaliação de Impacte Ambiental da Sondagem de Prospeção e Pesquisa na Área de Concessão Batalha” deverá recomeçar do zero.

Esta terça-feira, 3 de julho, a Plataforma Algarve Livre de Petróleo (PALP) [anunciou, em comunicado no Facebook, que as petrolíferas ENI/GALP não podem “executar trabalhos de nenhuma ordem”, até nova decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé. Assim, voltam a vigorar os efeitos suspensivos da providência cautelar que tinham sido interrompidos por três meses, devido a um acordo, celebrado em fevereiro, entre a associação e o ministério do Mar, tutelado pela ministra Ana Paula Vitorino.

Contudo, continuam marcados protestos para os próximos tempos. Dia 7 de julho, pelas 15h00, estão confirmadas ações em 20 praias nacionais (o número tem crescido e pode não ficar por aqui), numa ação designada “Petróleo é Má Onda“, contestando a exploração de petróleo em Aljezur. A 4 de Agosto, na Praia da Cova do Vapor, na Costa de Caparica, em Almada, está também marcado um evento de arte aérea com o mote “Parar o Furo” e que no ano passado juntou centenas de pessoas em Odeceixe contra a exploração de hidrocarbonetos.

O É Apenas Fumaça pediu esclarecimentos sobre este assunto à Agência Portuguesa do Ambiente, à Secretaria de Estado da Economia, à Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis e à Australis Oil & Gas Portugal. Aguardamos as respostas.

ATUALIZAÇÃO [04.07.2018, pelas 20h00] – No texto foram acrescentados os esclarecimentos enviados pelo gabinete de imprensa do Ministério do Ambiente, com a reação do Ministro Matos Fernandes à decisão da APA, que aconteceu na sua audição na Comissão de Ambiente da Assembleia da República, no passado dia 27 de junho. Foi também acrescentada a informação de que foram pedidos comentários à Entidade Nacional para o Mercado de Combustíveis e à Australis Oil & Gas Portugal, sobre o parecer da APA.

CORREÇÃO – Ao contrário do que se lia na primeira versão deste texto, a prospeção de petróleo ao largo de Aljezur não está proibida até ao final do ano mas, sim, de acordo com o Comunicado da PALP, até “até nova decisão do tribunal”. Foi também acrescentada a informação relativa ao acordo entre a PALP e o Ministério do Mar, relativamente aos efeitos da providência cautelar, que agora voltaram a vigorar e estavam suspensos.

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